Quando, escondido atrás de um pedaço de nada, que contornamos sem querer, no aparece este pedaço de luz… com raios quase partindo, para se cobrirem pela noite estrelada…
Mas, que delícia, ainda temos tempo para vermos o brilho quente que nos cobre o rosto, que se reflete na nossa menina dos olhos…
Tudo isso, ante um ânimo, o nosso, cabelos ao vento, que quase verte lágrimas salgadas em deleite, num instante de sorte maior por estarmos ali… por dele sermos parte…
Assim, parados sobre o rochedo vulcânico, sentindo fantasia sobre o espelho de água dourado, atlântico, mas agora sereno, que queremos abraçar e fazer nosso, nem que seja sonhando!
Campos fora, na meseta, são pigmentações, texturas, mas, sobretudo, a fragrância a lavanda, como feitiço de Mulher…
São prados floridos tão imensos que nos enfeitiçam ao pôr do sol, onde caminhamos vestidos de branco, para não perturbarmos a atmosfera cinemática…
Onde, pequeninos, soçobramos com tanta beleza junta… que as palavras são frugais para dela falarem…
Deixando os cabelos delas serem ainda mais belos, ao vento, até dançando, rodando os vestidos bordados… delas, das Mulheres, nossas deusas, e das florzinhas que, como as ninfas, adocicam o olfato, por esses momentos, o soberano e o mais privilegiado dos sentidos da vida!
Céu com traços em tons de ouro, pinceladas de bronze e relevos de cobre
Que sonho este em que ocorre colorir o céu com traços em tons de ouro, pinceladas de bronze, relevos de cobre, sobre o escuro das rochas costeiras e o cintilar alaranjado das águas quase quietas, onde paira o barco rumo a norte, com tantas histórias a marinar…
Devaneio meu que se tornou tela de luz com tons cálidos, espelho de domingo de janeiro, frio, mas com aquele sabor a Matosinhos, revisitado, a cada regresso!
Do areal, olhando para o astro que se oculta do lado de lá do mundo, apressado, no fio de mar, atiçando o despertar…
Aperto o agasalho, quase noite, mesmo!
É hora de um café quente, com torrada, na confeitaria da esquina, à meia-luz!
Tão inesquecível quanto a beleza da silhueta da Berlenga
Visitar as Berlengas é místico para uns quantos…
É verão, faz calor!
Ao chegar, após viagem à proa da embarcação, quase tocando o mar, uma reentrância, de águas turquesa e rochas bronzeadas, recebe e convida a subir a encosta, até ao topo, o que se faz de pronto, com tantas gaivotas sobrevoando a ilha maior.
Os olhos veem tudo em redor, mas o trilho é estreito, um pouco íngreme até!
Ah, meu Deus!!! Um travo de ar salgado... As paisagens valem o esforço, deixando espaço para devaneios.
Por instantes, ocorre o filme “Os Pássaros”, de Alfred Hitchcock, com aquela cacofonia das gaivotas, quase assustadora, que faz olhar o céu, vezes sem conta, mas o perigo não mora ali - as aves apenas saúdam os visitantes, talvez!!!
Olhando em redor, tanto mar, tantas ondas que se abraçam às grutas do ilhéu, em calmia...
E há o vento morno de norte - bem-vindo sejas - que levanta o cabelo e refresca o rosto ressequido pelo sol do meio-dia.
Baixar os óculos de sol e sentir aqueles ares atlânticos, apontando a nascente, para admirar o casario branco de Peniche, a cerca de 12 Km, numa península com “lobos do mar”.
A caminhada faz-se sem esforço, no topo da ilha!
Olhando à esquerda, a belíssima baía de águas coloridas, com o forte de São João Batista, a única construção a sério da ínsua.
No antro do pedaço de terra, o farol, que se ergue para espanto de quem por lá passa, parando, olhado-o!
À direita, no oceano, as traineiras que trazem carapau e a sardinha da faina, para gáudio da passarada, num cenário que enche o peito de quem vê.
A vegetação é rasteira, com muitos chorões floridos, e convida a descansar, sem olhar para o relógio, para mais uma observação atenta das aves que sobrevoam a ilha, em bando caótico, como pontos brancos que parecem dançar o twist, no céu azul… Ao fechar os olhos, vê-se ainda melhor!
A Berlenga Grande é pequena, com cerca de 1,5 Km, ponto a ponto, mas tem graça!
Visitá-la é uma experiência tão inesquecível quanto a beleza da silhueta da ilha que se deita no mar, ao pôr do sol, no regresso a Peniche.
Feliz, na popa da embarcação, olhar sumiço para registo do momento, em fotografia... E guardam-se as vistas, no coração, em tintas doces-pérola, para sempre!
Ah, meu Deus! Que delícia, quero muito parar o tempo, como numa aguarela do iluminismo, com cheiro a regalo e tudo!
Não posso, mas esforço-me, sem dor alguma, mas sôfrego, por agarrá-lo!
Tonto, meto a cabeça entre os ramos para me perder em volúpia de aromas.
Os sentidos, arrepiados, desfrutam, qual pintor na tela.
Na colina à beira da estrada, sem carros, debaixo da amendoeira, prima de tantas outras, de joelhos, ergo mil vezes os olhos e a alma para um céu tão mágico, prenúncio estival, azul como o brilho do firmamento, paleta de cores em aguarela.
Que contraste maravilhoso com a candura das flores brancas, singelas, que dançam à brisa, numa valsa de violinos sem pressa, que só nos apetece tocar, com delicadeza e, como as cordas do instrumento, afagá-las, com jeitinho, para não magoar tão imensa dádiva da mãe-natureza. Tê-las, por instantes, na palma das mãos, contraste com a pele morena, é fazermos parte daquele mundo, em devaneio até ao ocaso, uma sinfonia em silêncios.
O nosso olhar cintila, banqueteia-se, embriaga-se com tanta beleza. Deriva entre as florzinhas de pétalas de neve, açucaradas com pontos de amarelo-torrado, rosa ou tons de mel, como que a abrir alas para as obreiras da Primavera, com zumbidos atarefados que do pólen que extraem acentuam a fragância florida, perfume a mel de Olimpo, sobre o vale da Vilariça ou paredes-meias com as gravuras do Coa, que os olhos pasmam, ao lado do caminhar pachorrento do Sabor, rios milenares de mineiros, fios de azeite de oliva e das castanhas para magustos de contentamento.
É incrivelmente retemperador correr como caracol, entre amendoeiras em flor, subir à rocha para mais uma fotografia, neste clímax sazonal da natureza humanizada, em calçadas medievais ladeadas com muros de xisto dourado, que acentuam as bermas pintadas pelas árvores, em alamedas, com vestes brancas sem fim, carregadas de fruto que saboreamos às vezes, sem culpa.
A passarada, sem saber, canta para os nossos ouvidos deleitados, nos seus rituais de acasalamento. Que belo concerto, de tantos timbres, com o Douro azul, escarpado, lá ao fundo, no horizonte, a breve brisa de inverno, às portas de muralhas e castelos, com ruínas de aldeias ancestrais aos pés.
E, de peito aberto, à espera de tudo, mergulhar nos bosques de amendoeiras, com um pequeno cachorro das redondezas encantado com a visita, qual guia improvisado entre dois povoados romanos de ruínas quase recobertas por ervas do desleixo humano.
O fim de tarde chegou com a pressa dos dias pequenos, com ele o segundo ato do espetáculo, o pôr do sol, cor de citrino, atrás das encumeadas, nas nuvens tímidas, que as amendoeiras acolhem para ficarem ainda mais sublimes, de tons dourados, efémeros é certo, mas tão belos que as óticas dos homens ousam querer registar, sem sucesso!
A noite caiu, à espera de nova aurora neste espetáculo que a natureza e a sabedoria milenar dos Homens bons de Trás-os-Montes proporcionam aos forasteiros, como nós, que nos vergamos perante um quadro de belezas tantas que as letras não conseguem alcançar.
Só a alma, como o luar de Torre de Moncorvo e os nossos antepassados do Coa souberam sentir e guardar no coração, numa pétala de flor de amendoeira ou num esboço paleolítico, no xisto, para todo sempre!