De certeza que vai valer a pena voltar, para ver mais, no Trilho da Víbora!
No trilho da Víbora, algures na serra da Cabreira, não longe de Cabeceiras de Basto, as condições do tempo, com a chuva no horizonte, não permitiam mais…
Pelo que a caminhada ficou incompleta… Diria, mal começou… Mas os passos trilhados, de mãos dadas, em pouco mais de um quilómetro recheado de tanta beleza, valeram a pena, como um aperitivo delicioso para a jornada que ficou prometida para… um dia destes…com calçado adequado!
Os sentidos agradeceram e clamam pelo regresso, à espera de ver melhor e mais longe aqueles castanhos outonais, tapetes de folhas viçosos, aqueles bosques húmidos, aqueles sons das águas da levada que descem a montanha, aqueles moinhos cobertos de tanto verde, que apetece descobrir…
Tanto para ver e sentir, num cenário que nos surpreendeu a cada curva do trilho…
De certeza que vai valer a pena voltar, para ver mais, muito mais, em boa companhia, a partir da lagoa, serra acima, serra abaixo, para enchermos os pulmões de ar fresco e a alma de tanto prazer, de estar ali, simplesmente, ouvindo os sussurros da natureza...
Contemplá-las, ali - as cores - ao sol de novembro que queremos abraçar!
Estas pigmentações de outono, com as suas matizes, nuances e degradés, seduzem as almas dos sonhadores de quimeras, por caminhos entre socalcos, do leito do Douro até ao cume.
Como no Caminho de Jacinto, de Eça, à passagem, sem pressa, quedamo-nos ali, com semelhante beleza, numa simbiose acabada, multicolor, entre o engenho humano de tempos idos, numa casa rural, e a ode da natureza, trajada com tantas cores cálidas, dos castanhos, aos amarelos e ao carmesim, que nos acaloram o peito só de contemplá-las, ali, ao sol de novembro matinal que queremos abraçar!
Descrever não é pintar. Aos poetas faltam os pincéis, faltam as telas, os cheiros das aguarelas, os cavaletes, mas sobram as letras de escriva, a alma que brota pela pena, em estrofes de emoção, pontuadas com a exclamação e as rimas maiores da vida, sempre!
Há sítios mágicos, como este, na Rota das Faias, em Manteigas, na Serra da Estrela.
Sítios onde nos sentimos em casa, um lar ancestral, tão belo quanto esta alameda, de folhagens mágicas, de tons tão quentes, com raios de sol entre chuviscos que brotam abençoados das nuvens de São Martinho na serra, de ares tão cristalinos que, inspirando profundamente, nos enriquecem o espírito e nos fazem crer que, naquelas paisagens, de peito cheio de paz, somos privilegiados por estarmos ali, por um bocadinho fazermos parte desse universo maior, saboreando-o.
Foi assim, há dias, e foi tão bom caminhar por trilhos, no sobe e desce da Estrela, ora à chuva, ora ao sol, com as partidas do outono, com o Zêzere, bebé ainda, sempre por ali tão perto, barulhento e fresco para nos molhar as botas, quando saltitamos entre as pedras do trilho ou passamos por pomares de macieiras, de castanheiros, de medronheiros, de nogueiras, de oliveiras e arbustos de azevinho à beira da aldeia, sem pressas, porque o tempo por ali sabe esperar pela fotografia certa…
... ele chegou sereno, protegendo os olhos da luz de outono, de um cair da folha mundano, perto da capela de Santa Marta, que avisa, ao entardecer precoce, para os dias de Plutão, gelados e efémeros, e as noites de Saturno, gigantes e místicas, aquelas em que nos cobrimos com os anéis como camadas de memórias que giram em rodopios lusco-fuscos, num firmamento de devaneios... como uma história interminável...
A olhar o céu, daqui para lá, como nos símbolos que no traçam em sonhos, como buscando no transcendente o caminho certo que todos ousamos querer trilhar, sem certezas de quase nada!
Na levada do meu bosque, na minha pequena aldeia, aquele sítio mágico onde nos quedamos, de quando em vez, sentados na pedra coberta de musgo, como neste dia de quase outono, de sol apressado, entre a folhagem bronzeada.
Para, sem pressas, fecharmos os olhos e vermos sem olhar o passado, sentirmos o presente e, iris fitadas nas águas que correm para o rio, que vamos penteando com os dedos, instarmos o futuro e revelar-nos se amanhã vai ser como hoje ou se ontem, na alquimia do tempo, já foi e vai passar logo, no ocaso deste dia, ou de outro qualquer do calendário dos desassossegos que as flores de outono ressoam.