Hoje soube do encerramento de um jornal regional, de Guimarães, com o qual convivia quando era pequeno. O meu pai era assinante e todas as semanas era um ritual lê-lo junto ao meu progenitor. Terá sido, porventura naquelas páginas, que li as primeiras notícias.
O fim de um jornal com tantos anos é uma enorme perda para a comunidade que servia, para os hábitos e tradições das pessoas que o jornal ia retratando em cada edição, registando para todo o sempre os pequenos acontecimentos.
A terra que servia está mais pobre. As suas gentes também! Em vários concelhos que conheço já não há jornalistas no ativo porque, simplesmente, os jornais e as rádios vão fechando, numa agonia! Já quase não há quem escreva ou onde se escrever sobre as coisas que acontecem em cada recanto do país, nas pequenas comunidades!
Os últimos anos têm significado o fim de muitos jornais e rádios no norte do país, incapazes de enfrentarem tanta coisa em simultâneo, sobretudo as mudanças nos hábitos de leitura, com o “advento” dos suportes digitais, em que tudo é gratuito, até as notícias, e uma conjuntura económica que esventra as pequenas empresas e as famílias, aquelas que, com os seus anúncio ou assinaturas, iam assegurando as principais receitas dos ditos jornais.
É, acima de tudo, a consequência de uma crise brutal que tudo esmaga à sua passagem, mesmo os que, como nós, nada contribuíram para a sua chegada, nada fizeram para o défice galopante do país!
O que fazer para responder a sucessivas vagas de austeridade e aumentos de impostos é o que perguntam os empresários do setor que veem os órgãos que gerem perdendo audiências e receitas quase todos os dias? As receitas que pagavam os ordenados daqueles que vão ficando sem nada para fazer!
O que vão fazer os profissionais da imprensa regional num setor com horizontes de encolhidos, quase sem alternativas que garantam rentabilidade, sem capacidade de se internacionalizar.
A carolice de muitos jornalistas que ainda vão trabalhando a troco de quase nada há de, um dia destes, acabar, como já acabou para tantos que, cansados, desiludidos, por não acreditarem já no Pai Natal, baixaram os braços!
Ontem, ao observar a avalancha noticiosa televisiva sobre a dita “Greve Geral”, fiquei perplexo, porque se ficou com a ideia de que o país parou mesmo! Mas isso não aconteceu, posso afiançar com propriedade! Cá por cima, por terras do Tâmega e Sousa, onde se concentram os maiores polos produtores nacionais de mobiliário, calçado e metalomecânica, com dezenas de milhares de postos de trabalho, mas onde o emprego na administração pública é residual, nada se passou de extraordinário!
Foi um normalíssimo dia de trabalho, como era bem percetível no enorme movimento de viaturas nas horas de entrada e saída das fábricas, ou nos parques de estacionamento das empresas preenchidos por centenas de automóveis, como é normal num dia de trabalho por estas paragens!
Por isso, dizer-se que a “Greve Geral parou o país foi, no mínimo, sob ponto de vista jornalístico, pouco rigoroso!
Há dias, do baú de recordações, recuperei estas imagens que partilho agora com os meus amigos. Há muitos anos, em Fafe, foi assim que tudo começou no meu percurso profissional, sempre ligado ao gosto pela rádio e pela escrita. Naquela casa, que abrigava a Rádio Clube de Fafe e o Correio de Fafe, fizeram-se muitos profissionais, ajudados por mestres pacientes que recordo. Ali escrevi as primeiras notícias e realizei os primeiros programas, quase sempre ligados à informação.
Foram anos vivenciados com grande paixão pelo gosto de aprender, na procura de fazer mais e melhor, no gosto de comunicar!
Ali estavam a escrita e a música - duas paixões que nutria desde a infância – unidas num projeto que acabou por ser profissional.
Não sei se terá sido a opção certa, mas desde os tempos que hoje recordo, nunca mais parei nestas lides, apesar de tanta coisa ter mudado, na forma de se trabalhar e de estar na profissão.
Recordo simplesmente, com saudade e carinho, esses momentos tão bonitos, de um certo romantismo, de tantos sonhos!
Desde o início desta crise, em 2009, que muitos jornalistas, nomeadamente os mais “pequeninos”, que trabalham nos órgãos locais e regionais, lutam todos os dias por manterem vivos os seus órgãos de informação, afinal o seu ganha-pão. Infelizmente, muitos já caíram neste percurso atribulado, outros continuam ainda a lutar, aliás nunca deixaram de o fazer. Infelizmente, a crise avançou para os “grandes” e também alguns desses vão cair, não resistindo a tantas adversidades.
Vazio porque se percebeu a falta que a Lusa faz no panorama mediático português.
Basta olhar para os jornais online (e não só) e constatar que têm estado menos ricos de notícias e na cadência de atualizações. Por estes dias, o país ficou mais pequeno, mais inclinado para o litoral, mais bicéfalo, com dois pés nas duas grandes cidades.
Mas também para nós, correspondentes da Lusa longe dos grandes centros, faltava aquela “pressão” que tanto apreciamos e que nos faz trabalhar todos os dias na procura da melhor informação em cada cantinho dos nossos territórios, dando voz às nossas gentes, aos nossos empresários, às nossas associações e às nossas autarquias. Pluralismo é isto!
E só o fazemos porque a Lusa existe com vocação de serviço público presente em todo o território. Pôr fim a este património é algo que, confesso, me custa compreender e me recuso a aceitar como razoável.
O momento nos OCS é mesmo difícil, não vale a pena “tapar o sol” com a peneira.
Ontem fecharam mais três jornais em três regiões do país, arrastando mais gente, incluindo jornalistas, para o desemprego.
Mais três vozes foram caladas por esta crise tão imbecil, para a qual nada contribuíram.
De permeio, acumulam-se os salários em atraso noutros OCS que conheço e que ainda vão “soluçando” umas notícias.
No quadro atual de crise profunda acredito pouco no sucesso de títulos regionais em concelhos de dimensão pequena ou média, com tecidos económicos muito frágeis.
Os que, com anos de atividade contínua, têm ganho esta batalha - e são poucos no país - operam num contexto atípico, algo confortável, algo “protegido”, que irão porventura para além da natureza empresarial de mercado, tal como a concebo.
Alguns sobreviverão numa certa forma de ser e de estar no negócio, baseados em carolismos que rapidamente se esfumam com o desgaste dos dias, em remunerações paupérrimas e numa precariedade que me custa a aceitar.
Alguns têm apoios, às tantas legítimos, como os autárquicos ou da Igreja, que funcionam como balões de oxigénio.
Os que por azar, demérito ou outras razões não foram bafejados por esse tipo bálsamo, porventura porque se mantiveram fiéis aos seus valores da independência, vão perdendo o ar, provavelmente - receio muito - até à asfixia final.
Sucedem-se as notícias de encerramento de vários órgãos de comunicação social regionais: algumas rádios e muitos jornais que se vão calando, empobrecendo o pluralismo e com ele a democracia.
Os tempos são difíceis. É duro observar à nossa volta e ver definhar OCS da região, há não muito tempo observados como referência de qualidade, arrastando jornalistas e outros profissionais para a incerteza do dia seguinte, à porta do centro de emprego.
São páginas de jornais, outrora ricas de informação, que se fecham sem retorno. São microfones de rádios que brotavam notícias e que agora se calam, impotentes face à força das circunstâncias, à brutalidade da crise que cala a nossa voz.
Às dificuldades da mudança no paradigma da comunicação, algures entre o papel e o online, que nos confrontam com dúvidas diárias sobre como, quando e onde apostar, acrescem as circunstâncias de uma conjuntura económica muito difícil, com a qual nunca me tinha confrontado em 20 anos de profissão.
Estamos perante uma conjugação de fatores adversos que nos fazem refletir todos os dias sobre o futuro ou a falta dele neste setor de atividade.
Resultado da recessão que avança desde 2010 nas pequenas e grandes economias, o mercado publicitário vai emagrecendo, acentuando as dificuldades que OCS regionais que dele dependiam quase na totalidade para manterem o seu equilíbrio financeiro.
Às vezes sinto que a luta diária que travamos é inglória, tão grandes são os obstáculos que se nos colocam e que nos transformam, quiçá, em presas frágeis às investidas eivadas de outros valores.
Valerá a pena, nesta conjuntura, continuar a nossa missão de informar, de serviço público, sem comprometer valores que nos são tão caros como a nossa independência?
Se, como se receia, a economia não conseguir no médio prazo inverter este ciclo de declínio, as dificuldades vão continuar a calar muitas vozes, a cada dia que passa, até ao silêncio final, até ao deserto das notícias... empobrecendo a democracia.