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Marca d'Água

Marca d'Água

27
Mar22

Prados acordados, por magia, de novo!

Vestes de pétalas à brisa saltitando da alcofa


Hoje dei uns passos na aldeia, reencontrei velha amiga, a Primavera

Bela deusa com flores me presenteia

Amarelos viçosos e brancos mármore à espera

Prados acordados, por magia, de novo!

 

Esquilos ensonados espreitam para ver se a diva chegou…

Sim, ela, com cara de Vénus, ali levando cesto de calor e bonança para o povo

Cuco avisa a vizinhança que o Inverno já passou

Primeiro dia crescido do ano, que bom…

Mais horas para temperar o entardecer, com folha de louro

O sol deitou-se tarde, prometeu amanhās de bom tom…

Mas a levada vai quase vazia, o moinho teme pelo seu tesouro

A chuva de abril há-de cair

Gotículas mil para saciar a sede do regato

Porque a Primavera é fértil para os celeiros provir

O povo vai celebrar, com malhões na eira e presunto no prato

Nos atalhos do bosque, a terra já é fofa

Muros trajam musgos e hera

E há vestes de pétalas à brisa saltitando da alcofa

E o cheiro a mel ao vento, humm… valeu a espera!

Promaver na aldeia.jpg

Os dias longos vão aquecer

Os frutos vermelhos vão adoçar

Os ninhos com crias a crescer

E Cupido nos corações dos amantes vai tocar

 

Armindo Mendes, 27 de março de 2022

23
Mar22

Quando a noite cai

À sombra, como guiga à bolina


azenhas Amarante.jpg

Palavras, forma de esboços de nós

Letras, formas de fios de água do peito

Rascunhos, formas de rabiscos a sós

Folhas brancas, formas de desabafo a eito.

 

Quando a noite cai, a luz esvai-se

Quando a noite cai, o semblante esmorece

Quando a noite cai, a vontade contrai-se

Quando a noite cai, o coração amolece.

 

Luz apagada, olhamos para dentro

Luz apagada, as nossas entranhas

Luz apagada, âmago em nós, ao centro

Luz apagada, rodopios em nós, suplicamos manhãs.

 

Sol raiou, acordar sobressaltado

Sol raiou, noite, ao postigo desassossego passou?

Sol raiou, vulto ao espelho, lavado

Sol raiou, não sei para onde vou.

 

Na rua, olho tudo, vejo pouco

Na rua, dou passos, sem em andar a pé

Na rua, o jornal do mundo louco

Na rua, como Pascoaes, tomo café.

 

Sigo a alameda, à beira rio, para a neblina

Sigo, costas ao sol, para o açude

Sigo à sombra, como guiga à bolina

Sigo inquieto, como poeta, do que não pude.

 

Sento no muro, Tâmega, confidente

Sento, procuro papel e caneta

Sento para escrever, sem jeito fluente

Sento, traço espírito meu em silhueta.

Amarante cidade rio Tâmega copiar.jpg

O Covelo, nas águas, espelho de nós

O Covelo dos gansos idos para algures

O Covelo das inundações sonhos levar

O Covelo dos arcos da ponte para nenhures.

 

Escrita de coisas em dia sem graça

Escrita sem nexos, após noite sem parar

Escrita de estados que alma perpassa

Escrita que o tempo vai esbater, sem obliterar…

 

Armindo Mendes, 23 de março de 2022

 

 

 

18
Mar22

Véu para as lágrimas, refúgio das feridas

Papoila no cabelo, como um só!


Lisboa à noite.jpg

Mão folheia livros do sim e do não…

Hieróglifos de odisseias, de moldes de bustos.

Pinceladas de Gioconda, James Last de acordeão…

Calo de enxada, punho de brutos!!!

 

Mamilo de mãe para saciar…

Afago em rosto enrugado da avó.

Mão de pai grisalho de tanto amar

Papoila no cabelo, como um só!

 

Mão na dor, no aceno, nas eternas partidas?

- Dedo em riste, palmas: humanos como são.

E véu para as lágrimas, refúgio das feridas?

- Cicatrizes, mão cerrada, sob o pontão.

 

Armindo Mendes, 18 mar 2022

18
Mar22

Dar a mão não é mandar…

Bolero de unhas em dança, no pico da ilha


Papoila Alentejo.jpg

Mão é extremidade do coração?

- Talvez feições do peito, dedos sem voz.

Mas na palma há riscos de canção?

- Às vezes, trovas entrelaçadas, mesmo sós

 

Com galanteio, rogar mão amada?

Ofertar-lhe mão forte!

Deitar mão a tudo e nada?

- Além, no celeiro, à procura de sorte.

 

Dar a mão não é mandar…

É não ter mãos a medir!

Bronze e pérola, dois a acreditar…

Para dedos entrelaçados florir!

 

A mão ampara, percorre, arrepia…

A mão aquece, aponta o caminho.

A mão benze na fé, alumia!

Com Ele, não estás sozinho!

 

A mão dócil vê, repousa no regaço!

Mão cheira a ternura, a folia…

Primeira mão, primeiro abraço...

Beijo molhado que o coração alumia.

 

Mão no baton, no fogo, na luxúria…

Não ter mãos a medir na partilha…

É tricotar, câmara lenta, com fios de fúria…

É bolero de unhas em dança, no pico da ilha.

 

Armindo Mendes, 18 mar 2022

17
Mar22

Peito aberto, à espera de tudo

belezas tantas que letras não conseguem alcançar.


flor de amendoeira por do sol.jpg

Foto: Armindo Mendes

Ah, meu Deus! Que delícia, quero muito parar o tempo, como numa aguarela do iluminismo, com cheiro a regalo e tudo!

Não posso, mas esforço-me, sem dor alguma, mas sôfrego, por agarrá-lo!

Tonto, meto a cabeça entre os ramos para me perder em volúpia de aromas.

Os sentidos, arrepiados, desfrutam, qual pintor na tela.

 

Na colina à beira da estrada, sem carros, debaixo da amendoeira, prima de tantas outras, de joelhos, ergo mil vezes os olhos e a alma para um céu tão mágico, prenúncio estival, azul como o brilho do firmamento, paleta de cores em aguarela.

Que contraste maravilhoso com a candura das flores brancas, singelas, que dançam à brisa, numa valsa de violinos sem pressa, que só nos apetece tocar, com delicadeza e, como as cordas do instrumento, afagá-las, com jeitinho, para não magoar tão imensa dádiva da mãe-natureza. Tê-las, por instantes, na palma das mãos, contraste com a pele morena, é fazermos parte daquele mundo, em devaneio até ao ocaso, uma sinfonia em silêncios.

O nosso olhar cintila, banqueteia-se, embriaga-se com tanta beleza. Deriva entre as florzinhas de pétalas de neve, açucaradas com pontos de amarelo-torrado, rosa ou tons de mel, como que a abrir alas para as obreiras da Primavera, com zumbidos atarefados que do pólen que extraem acentuam a fragância florida, perfume a mel de Olimpo, sobre o vale da Vilariça ou paredes-meias com as gravuras do Coa, que os olhos pasmam, ao lado do caminhar pachorrento do Sabor, rios milenares de mineiros, fios de azeite de oliva e das castanhas para magustos de contentamento.

É incrivelmente retemperador correr como caracol, entre amendoeiras em flor, subir à rocha para mais uma fotografia, neste clímax sazonal da natureza humanizada, em calçadas medievais ladeadas com muros de xisto dourado, que acentuam as bermas pintadas pelas árvores, em alamedas, com vestes brancas sem fim, carregadas de fruto que saboreamos às vezes, sem culpa.

A passarada, sem saber, canta para os nossos ouvidos deleitados, nos seus rituais de acasalamento. Que belo concerto, de tantos timbres, com o Douro azul, escarpado, lá ao fundo, no horizonte, a breve brisa de inverno, às portas de muralhas e castelos, com ruínas de aldeias ancestrais aos pés.

E, de peito aberto, à espera de tudo, mergulhar nos bosques de amendoeiras, com um pequeno cachorro das redondezas encantado com a visita, qual guia improvisado entre dois povoados romanos de ruínas quase recobertas por ervas do desleixo humano.

O fim de tarde chegou com a pressa dos dias pequenos, com ele o segundo ato do espetáculo, o pôr do sol, cor de citrino, atrás das encumeadas, nas nuvens tímidas, que as amendoeiras acolhem para ficarem ainda mais sublimes, de tons dourados, efémeros é certo, mas tão belos que as óticas dos homens ousam querer registar, sem sucesso!

A noite caiu, à espera de nova aurora neste espetáculo que a natureza e a sabedoria milenar dos Homens bons de Trás-os-Montes proporcionam aos forasteiros, como nós, que nos vergamos perante um quadro de belezas tantas que as letras não conseguem alcançar.

Só a alma, como o luar de Torre de Moncorvo e os nossos antepassados do Coa souberam sentir e guardar no coração, numa pétala de flor de amendoeira ou num esboço paleolítico, no xisto, para todo sempre!

17
Mar22

Riacho que desconfia do fim

Em breve limbo de açucenas


Rio Jugueiros.jpg

Ao espelho fosco sou letargia

Olhos escuros, húmidos, parados

Brechas despidas de fantasia

Pensares por ora estagnados

 

Expressão frívola, sem luz, sim

No cantinho do costume

Riacho que desconfia do fim

À corrente do queixume

 

Que treme, acerca-se a cachoeira

É pequena, mas receia cair

Esconde-se na trincheira

Leito onde nada, imóvel, para fugir

 

Espelho: “Que pessoa és?

Braços tombados, olhar vazio?

Agarrado ao cabo com os pés?

Retorcido, sem ganas de porfio?

 

… Vai, deixa-te ir na corrente…

É calma, sem Adamastor, vais ver.

Dobrarás talvez pungente

Mas, se ousares, boiarás para viver.

 

Senta-te na folha de outono, navega!

Segue nas águas de vagas serenas

Inspira, vê a natureza sôfrega

Verás em breve limbo de açucenas

 

Olharás o céu desnudar-se, inspira

Invernos idos de lareira arrefecem

Mas abril da utopia desabrochará

julhos dos calores, sim, florescem!

 

 17 março de 2022

 

 

17
Mar22

Quando a alma dos servos indaga o alento dos de além

Em barca com insígnias de paz!


Em existências como esta, com velas latinas que se obliteram sob os engulhos do destino, é quando a alma dos servos indaga o alento celeste dos de além, dos ancestrais, na prece do coração, o nosso, por clarões de esperança, por um arco-íris até ao mar da tranquilidade, azul-turquesa.

Igreja de Cortegaça.jpgFOTO: Armindo Mendes (Direitos Reservados)

Numa barca com insígnias de paz que baila aos ventos alísios, uma barca de opala com convés acolchoado com penas brancas, suprido de sustentos para os corpos e para as almas, até avistarmos, no firmamento, a constelação “Apuse”, a ave do paraíso, a apontar para a praia de areias brancas, onde espera Ariel, o arcanjo da natureza e dos animais, com açafates de salmão, pão de Deus, cocos refrescantes, uvas moscatel e papos de anjo, para sermos todos irmãos que se abraçam em gesto perpétuo, maior que tudo e que todos!

17 de março de 2022

16
Mar22

Na música das artes...


... A música é uma das seis artes clássicas e o que de mais belo convoca um dos cinco sentidos humanos: a audição - um carreiro para a nossa alma.

A clave de sol abre alas para a pauta das notas em partituras de sopro, voz, cordas, percussão e eletrónica que a batuta do maestro cadencia.

Há séculos idos, a criatividade humana criou a magia da música.

Como o pintor renascentista na tela, o ator de, toga, no coliseu de Roma ou Mérida, declamando Omero, ou o escultor de Creta no mármore dando forma a Ulisses, o compositor imagina e pinta ressonâncias, dá linhas de melodias a uma amálgama de notas musicais, dó, ré, mi, tão sabiamente encadeadas que resulta em fá, sol, lá, quais obras-primas, como as valsas, as sinfonias, os fados ou as óperas dos autores clássicos, e até no pop-rock dos nossos tempos, numa linguagem universal, de Behtovan a  Pink Floyd, que escusa legendas e une os povos à volta de uma canção de amor, de uma trova que exalta valores, um hino trauteado em todas as latitudes geográficas e de peitos de aquém e além mar, não importa a cor da pele ou o credo.

Dos dedos agitados do guitarrista, da subtileza que afaga a harpa, da voz do tenor que se ergue para lá do comum-mortal, do requinte do xilofone ou do sopro de prata do trompetista transpiram ecos, como os gemidos do violino e os graves da bateria que calam o silêncio da superficialidade, como a pena do escritor que rabisca à luz da vela com palavras de narrativas uma folha branca, para a transformar num soneto de belas rimas ou numa ode ao deleite dos sentidos, da contemplação, da imaginação de contextos, de amores arrebatadores, que até as telas de cinema obsequiam em grandes produções que só a sétima das artes ousa fazer, num clímax de emoções, até onde a chama houver.

É a dança das artes que no palco dos vivos e dos nossos maiores já partidos, com alma, rasga a banalidade, que faz de nós seres com pracetas de estilos vários, que, nas calçadas da nossa quietude, à lareira ou na margem do riacho, clamam por ritmos, cores, declamações a partir do Restelo, ou poemas, sermões aos peixes e outras linguagens para os sentidos, esses, os nossos pelo coração ligados, que dão sentido à vida, que nos tocam o âmago, como uma música, a da nossa vida, que nos tatua a alma, como um campo de malmequeres que ondulam ao vento, por entre a neblina fresca da alvorada ou páginas de um livro aberto ou uma tela de Van Gogh, em tons ora pastel ora arco-íris.

A música é contemplação e o janelo para olharmos com os ouvidos, de peito feito, para o milagre de sentirmos, de existirmos...

16
Mar22

Cone de Vulcano que abraça a lagoa

Pedaços de terra do mar se ergueram para tantos cantares


Hoje “andei” nas Atlântidas, esmeraldas dos lusitanos mares

Porque em quase todas, deixei frações de mim

Nos seus mistérios avistei Açores em longos voares

Como aves que dos cumes veem formosura sem fim

Pedaços de terra do mar se ergueram para tantos cantares

nacer so sol Ilha das Flores.jpg

Que inveja não poder voar, planar sobre o verde intenso

Tomar aquela bruma, como navio com maré à proa

Ver bosques encantados de criptomérias e incenso

E o cone de Vulcano que em basalto abraça a lagoa

E o chapéu do Corvo que esconde o caldeirão imenso

 

Nas águas calmas das Sete Cidades ser peixe e nadar

No azul e verde cálido das lágrimas da lenda

Ter Gorreana com lêvedo para amantes saborear

No Cerrado das Freiras amores obsequiam a oferenda

Ou nas Flores, na Fajã Grande, o sol poente nos deleitar

 

Abundâncias de prazer descem a encosta em fumarola

E nas poças termais da Caldeira Velha ou Terra Nostra chapinhar

À volta, floresta exótica de aromas de enxofre que consola

Além, o mar beija as negras areias para Neptuno se deleitar

Com as violas de corda da Terceira que choram modas da cantarola

Açores Ilhas das Flores poer do sol.jpg

Fajãs belas sem igual, canto maior para cascatas

Cristalinas caem das serranias e fertilizam povoados

Aldeias de casas caiadas ou negras de gentes pacatas

Quintais com muros de hortências guardam bovinos gados

Filarmónicas, casas do povo, para domingos de gravata

Fotos Açores 2014 São Jorge e Pico (18) copiar.j

Dos vulcões admirar as ilhas da vizinhança em espelho

No azul sem fim, contemplar cetáceos em baile da natureza

No parque saborear queijo de S. Jorge e quiçá verdelho

Mergulhar nas grutas, tubos das lavas há milhões, proeza

Laurissilva densa, árvores até ao céu, em cada concelho

 

Centenários moinhos de velas brancas são as coroas de terra nobre

Como as prateadas de Espírito Santo, porque a fé ali é eminente

Os faróis hirtos na costa alumiam o que neblina recobre

Alcatra para o almoço, peixe-espada para a janta quente

Inhame e leite, sustento açoriano, que sempre sobra

São Roque do Pico.jpg

Praças, fachadas, igrejas coretos, chaminés, jardins dos povoadores

Nas vilas, aldeias e cidades das Atlântidas, tantas joias

Fortalezas, palácios, marinas de gin tónico, velejadores

Nas ruas de história, vemos o Minho, o Alentejo e terras saloias

Sotaques, costumes, doçaria de gentes dignas, as dos Açores!

 

16 mar 2022

 

15
Mar22

PORTO: Estátua de Vimara Peres, o primeiro conde de Portucale, a partir de 868

Junto à Sé Catedral, do Século XII


Foi também o fundador de um pequeno burgo fortificado, designado ‘Vimaranis’, derivado do seu nome, atualmente a cidade de Guimãrães, que foi o principal centro governativo do Condado Portucalense. Foi em Guimarães que faleceu, em 873.Sé do Porto 3 copiar.jpgFOTO: Armindo Mendes (Direitos Reservados)

12
Mar22

Cinco sentidos!

Esperança, brumas das Atlântidas


Açores Ilhas das Flores poer do sol.jpg

Tato, poder alma de outrem afagar; Tato, dedilhar-lhe o coração; Tato, olhos sem brilho enxugar; Tato, abraço de pai em rebento filho; Tato, percorrer pele sem destino, volúpia; Tato, cama sôfrega ou dar a mão!

 

Olfato, prados de aroma em Sol maior; Olfato, fragrâncias do corpo doce de amoras; Olfato, entender cada flor carmesim, Afrodite até ser dia; Olfato, abrir cacifos de música em cristal; Olfato, desnudar de papoila, em pátio de Córdova, peito cheio...

 

Paladar, como vida, ora doce, ora sem graça; Paladar, sabor a framboesa coberta de agridoce; Paladar, manjar de castanha, espírito Luso, o fado; Paladar, gelado de manga, em dança de bombons! Paladar, amêndoas recobertas de mel, após frutos do mar!

 

Audição, aquele flautim de palpitações da vida; Audição, queixumes, contrabaixo sem voz, só dor; Audição, em León, delírio de Kitaro que serena; Audição, sinos de Mafra que atiçam seres sem flama; Audição, liras de assombros ou violinos de amor!

 

Visão, Cosmos na penumbra da sorte; Visão, ver rimas de afetos na autora; Visão, esperança nas brumas das Atlântidas, cabelos à maresia no canal; Visão, nos feitiços da Lua os fragmentos d`alma;

Visão, palatos, partituras, odores de centeio, sermos maiores!

 

Armindo Mendes, 12 de março de 2022

nacer so sol Ilha das Flores.jpg

07
Mar22

Vontade de saltitar descalços de orgulhos

Lmbrando tantas vezes Kiev, cidade com irmãos e filhos como os nossos e pais como os de Mirandela!


A magia da música com volume e ritmos desapressados, a tocar a alma, enquanto lemos um belo poema, num livro de páginas cheirosas, de damasco, macias ao dedilhar, num rodopio de palavras que nos consolam, que nos aguçam o espírito, entre devaneios tantos, de março domingueiro, sob a luz sépia, quase bronze como os solos de lá, e do prado de oliveiras, em fim de tarde latino, como nos filmes de acento francês, pontuado com pepitas cor de flor de amendoeira.

Paisagem Mirandela.jpg

Aquelas que nos atiçam a vontade de saltitar, descalços de orgulhos, atrás do sol, o astro da vida que, ora sisudo ora de sorriso, se põe a Oeste, atrás da montanha, ali onde soam, com ecos, com vagas de ressonâncias dos ventos de Norte perturbados pelos faróis dos carros, os dos homens que rasgam a paisagem...

Sim, as flores amarelas, petizes, natureza pura, ainda são carpete de sonhos, onde me sentei, só dos ousados, outrossim, que o zum zum, zum das abelhas cor de mel vão adormecendo para um serão frio, na Terra Quente, de azul quase estrelado, curiosa ironia que lembra a bandeira da Ucrânia.

O assobio do pássaro, ao longe, tipo, humano, interpela-nos, em todos os sentidos, no quase luar minguante!

Volto-me para nascente, não ouço o rebombar das bombas a Leste, nem os gritos lancinantes dos inocentes, só vejo os cavalos que pastam graciosos no vale de verde viçoso, à frente da cabana, que vão dormir, como o rebanho de ovelhas que, à ordem do pastor solitário, como na canção, sobem a colina, guardadas por dois cachorros que ladram só porque sim…

E logo as lãs, em fila ordeira, se escondem atrás do monte das oliveiras, com sopé de trilhos de ferro de um progresso, outrora a vapor, caído ora em ruína, por terras de Mirandela... À margem do Tua, rio de filões minerais que os romanos exploraram, hoje calados.

Já na pequena urbe, homens enrugados, desconsolados por vidas duras, esbracejam, bebem minis no tasco do costume, numa parafernália de conversas sobre as guerras fratricidas de hoje dos povos eslavos, irmãos desavindos, sem culpa, pela ganância de tiranos, cinzas nos pensamentos, num dia como outro qualquer ou talvez não, que eu vi passar, caminhando, olhando para tudo ou nada, de olhos fechados, lembrando tantas vezes Kiev, uma cidade com irmãos e filhos como os nossos e pais como os de Mirandela!

Papa João Paulo II Mirandela silhueta.jpg

Ali João Paulo II, o Homem de Branco, um dia ergueu as suas preces, num momento perpetuado por nuvens de inquietação com as loucuras paranoicas dos Homens de ourora e de hoje.

 

06 de março de 2022

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  245. O
  246. N
  247. D